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Imagem em preto e branco. Desenho de uma mulher e um homem nas costas dele com a mão no seu ombro. |
Antes de iniciar este texto que vão relatar três situações diferentes ao longo da minha vida na cadeira de rodas, deixo a explicação do que é Assédio Sexual.
“Assédio sexual é todo o comportamento indesejado de caráter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.”
Desde que me tornei uma mulher com deficiência, foram poucas as vezes que recebi aquele olhar com segunda intensão, por mais que hoje eu entenda que é crime um homem importunar uma mulher, confesso que quando recebia este olhar me sentia mais MULHERÃO.
Era como se eu entrasse nos padrões aceitos pela sociedade ao me sentir bonita, linda e desejada por um homem, não que eu dependesse essa aceitação, mas levando em conta toda minha história e trajetória após me tornar uma mulher cadeirante.
Hoje mais madura e dona de mim, não aceito ser importunada com olhares e desrespeito de nenhum HOMEM.
Esse história que narro, marca uma mulher vítima de tentativa de feminicídio que ao longo dos anos teve seu corpo transformado, deixando de lado as curvas e ganhando marcas pelo corpo, baixo peso e uso de uma cadeira de rodas, pronto eu já fazia parte dos corpos Assexuados, aqueles que Não transam, Não dão prazer e Não sentem prazer.....
O primeiro Assédio aconteceu comigo e minha mãe, estávamos na parada e ela se afastou de mim um pouco para fumar, aquele homem achou que eu estava sozinha e foi para um canto da parada e começou a me olhar e se masturbar.
Me assustei de ver aquilo e com medo me aproximei da minha mãe e relatei a cena, ela ficou furiosa e começou a gritar e xingar ele, até ele sair correndo.
Lembro exatamente o pânico que tive, era a primeira vez que eu passava por aquilo, e poderia estar sozinha.
Em casa fiquei pensando se não era a minha roupa que eu vestia que tinha feito aquele cara sentir prazer, naquela época era como se a culpa fosse a minha.
Com a ideia de evitar usar aquela roupa com medo que acontecesse novamente, e eu estivesse sozinha.
Segundo fato, fui ao centro com meu companheiro descemos do ônibus e seguimos, ele empurrando a cadeira, até que um senhor se aproxima de nós e pede para falar com ele se afastando de mim.
Fico apreensiva e aguardo, quando ele vai embora, meu companheiro pergunta se estou com um vestido curto, respondo que não, ele conta que o senhor nos parou para dizer que eu estava com a minha calcinha aparecendo.
Um vestido na altura do joelho vai aparecer a calcinha, seguimos nosso destino, mas me sentindo perturbada com aquilo e inquieta.
Chegando no meu destino me despeço dele e sigo para fazer minhas coisas, de repente um homem aparece do nada e grita bem alto para todos ouvirem, moça tua calcinha tá aparecendo.
Fico desorientada no meio da rua, sem saber para onde ir, paro perto de uma conhecida e pergunto para ela se via a tal de calcinha, responde que não, tu tá é linda por isso estão te perturbando.
Me olho mesmo assim e não vejo nada de errado, resumindo aquilo me perturbou tanto que deixei de fazer minhas coisas e voltei para casa.
Infelizmente me senti culpada mais uma vez por estar usando um vestido com decote V, que marcava o meu. Lindo por sinal.
A última que lembro agora, pode ter mais, mas posso ter esquecido.
Estava sozinha andando pela Andradas olhando as lojas, eu e Penélope (cadeira de rodas), de repente um homem toca no meu ombro e para na minha frente fazendo eu parar a cadeira e quase cair.
Quando parei ele me olha profundamente e diz varias vezes, mulher tu é muito linda, já te disseram isso, fico sem saber como agir com aquele homem me impedindo de seguir.
Até que ele se toca que fico sem jeito e pede mais de uma vez desculpa e finaliza dizendo mas tu é muito linda.
Sigo desorientada pela rua sem saber o que fazer e resolvo ir para o Coletivo, me senti com medo, e dessa vez nem lembro a roupa que estava usando.
O ato de violência de cada situação que eu trouxe deixa claro que os homens são autorizados por esta sociedade para cometerem crimes como estes.
Importunar, ter o direito de desrespeitar, tocar no nosso corpo e violentar, marca um cenário vivido por nós mulheres.
Segundo pesquisa (Fórum Brasileiro de Segurança Pública ao Instituto Datafolha), 26,5 milhões de mulheres foram assediadas na rua ou trabalho, através de cantadas, palavras desrespeitosas, beijadas a força e agarradas.
Dados estes que apontam uma cultura milenar e patriarcal em que a mulher é objeto de desejo dos homens.
As cantadas na rua reforçam essa cultura e demonstram qual é o lugar da mulher, de objeto e desejo, podendo ser tratada com desrespeito.
A Pandemia teve um aumento sobre os casos de importunação sexual em espaços públicos, sendo 3 em cada 5 já mulheres sofreram algum tipo de violência sexual pública.
ALei Federal nº 13.718/2018, mais conhecida como Lei de Importunação Sexual, tornou crime “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, com pena que pode variar de um a cinco anos de prisão.
Como importunação sexual estão inclusos casos como cantadas invasivas, beijos forçados, toques sem permissão, até mesmo casos de ejaculação, que já foram registrados dentro do transporte público impulsionaram a criação desta lei.
Só vamos mudar esta realidade através da educação NÃO sexista, Feminista, com ações de prevenção, promoção de direitos e responsabilização dos que praticam estes crimes.
Denuncie, através do 180 ou 190, não se cale nunca!