28 de mai. de 2013

MORTALIDADE MATERNA: COMOVE, MAS NÃO MOBILIZA

REDE FEMINISTA DE SAÚDE.

“O… nome de mulher é tão sagrado
Mulher… é nome pra ser respeitado
A cobra não morde uma mulher gestante
Porque respeita seu estado interessante (…)”
(Nelson Cavaquinho, J. Ribeiro, Guilherme de Brito).
A música é boa… no entanto, quando são considerados os números da morte materna no Brasil, as palavras do poeta são ignoradas.
No Brasil, a razão de morte materna (RMM) no ano de 2010 foi de 68 mortes maternas por grupo de 100 mil nascidos vivos, caindo para 63,9 em 2011. Apesar de apresentar redução o índice continua muito acima do que a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera aceitável, que é de 20 mortes maternas para cada 100.000 nascidos vivos.
A hipertensão e a hemorragia são as duas principais causas específicas de morte materna. A infecção puerperal e o aborto aparecem como outras importantes causas obstétricas diretas de morte materna. (Boletim, 1/2012 – MS)
A Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos desde a sua articulação, no início dos anos 90 do século passado, sempre teve como foco a discussão, o debate, a formulação de propostas e o monitoramento da morte materna em nosso país.
Desta forma a data de 28 de Maio – “Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher”, a Morte Materna é o tema central no Brasil, é um momento interessante para algumas análises.
A morte materna, para nós do movimento feminista, sempre foi analisada dentro do conjunto de circunstâncias relacionadas com os indicadores de adoecimento e morte das mulheres. Não se trata, portanto, de um evento isolado que é vivenciado pelas mulheres na idade reprodutiva. É muito mais o resultado da precariedade da assistência à saúde, da desigualdade de gênero, do preconceito, do racismo, da alienação, dos fundamentalismos religiosos, da expropriação do corpo da mulher pela sociedade patriarcal, do mercantilismo do sistema de saúde assistencial-privatista, do esvaziamento das práticas e princípios do Sistema Único de Saúde – SUS.
É, acima de tudo, o resultado da submissão do Estado brasileiro às imposições da política internacional, como o Relatório do Banco Mundial de 1993 – “Investindo em Saúde”. A partir daí passou a adotar, na contramão do Sistema Único de Saúde – SUS, as políticas focalizadas para a assistência à saúde substituindo as políticas universais, equânimes e integrais por ações pontuais e restritivas. Desta forma ocorre uma constante, gradual e persistente decadência das ações e serviços voltados para a saúde da mulher em nosso país e do SUS como um todo.
Quando em 1983 foi lançado o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher – PAISM, ainda na vigência da ditadura militar, houve um avanço conceitual e normativo, pois foi o início da superação da lógica de atenção denominada de “Materno-Infantil”. A formulação indicava a separação entre saúde da mulher e saúde da criança. Ampliava o âmbito de atuação, a mulher era vista como um ser integral, que adoecia e morria de todas as causas pelas quais adoecem e morrem os habitantes desse país. Incluía o atendimento à mulher em todo o seu ciclo vital, além de considerar as especificidades das condições de vida, classe social, raça/etnia, orientação sexual, origem geográfica, entre outras. Estas concepções foram aprofundadas e implementadas a partir de 2003; sendo que em 2004, o PAISM transformou-se um uma política (PNAISM). Após esse período foi apresentado ao país o “Pacto pela Saúde – 2006”, um acordo entre gestores, que reduziu drasticamente a abrangência das ações para a Saúde da Mulher. Esse pacto adequou as propostas da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher – PNAISM aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – ODMs.
Na campanha eleitoral de 2010 surge um fato novo: a Rede Cegonha! Uma viagem onírica, baseada no antigo imaginário infantil sobre a origem dos bebês. Um dos objetivos principais da Rede Cegonha é a redução da morte materna no Brasil. Ao que parece as dificuldades persistem e a redução não atingirá nem as metas do milênio. Enquanto isso a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher foi desmontada, assim como ocorreu também, o desaparecimento do Pacto Nacional contra a Morte Materna e Neonatal e por fim, o esvaziamento dos Comitês de Morte Materna.
E assim caminha a saúde das mulheres, a morte materna e os compromissos do Estado brasileiro com a sociedade e com os órgãos internacionais.
Para agravar o quadro, o Brasil assiste perplexo o Congresso Nacional ser transformado num Tribunal de Inquisição, onde pululam deputados/pastores/padres, enlouquecidos e misóginos, em bancadas pela “vida”, contra a legalização do aborto e que agora se voltam contra o movimento feminista. Ameaçam as mulheres e suas entidades organizativas com sucessivas Comissões Parlamentares de Inquérito – CPIs, Estatuto do Nascituro, Bolsa-Estupro escancarando o avanço sórdido de posições retrógradas e fundamentalistas. A Rede Feminista é arrolada numa dessas CPIs como criminosa, o que coloca o Brasil entre os países em que as defensoras de direitos humanos são perseguidas e os movimentos sociais criminalizados.
As perguntas que fazemos são as seguintes:
- Como diminuir a incidência/prevalência da morte materna e o aborto sem prevenir a gravidez indesejada?
- Como prevenir a gravidez indesejada, sem dados confiáveis para o planejamento em saúde, já que o aborto, sua principal resultante é considerado crime e é realizado na clandestinidade?
- Como resolver um problema de Saúde Pública, como a Morte Materna e o aborto sob uma ótica religiosa, baseada na culpa e no pecado, que fere o princípio da laicidade do Estado, que atenta contra a Constituição da República?
- Como vencer a covardia do Executivo e do Legislativo que se dobram às imposições das bancadas religiosas, atrasadas, histéricas e eleitoreiras?
Essas questões acima conduzem às últimas perguntas:
- Por que se fazem passeatas, cultos, cerimônias macabras, contra a legalização do aborto e não acontece, de parte desses mesmos setores (“pró-morte das mulheres”), nenhuma mobilização contra a morte materna?
- Caberia somente às mulheres, notadamente as feministas, lutar pelo fim dessas mortes ou quase mortes evitáveis e eticamente inaceitáveis?
- Porque nossos gestores de saúde (municipais e estaduais), não implementam os serviços para o atendimento do aborto nos casos previstos em lei?
- Porque não se garante a todas as mulheres o acesso às tecnologias médicas que podem salvar a vida das gestantes? (acesso ao Centro de Terapia Intensiva – CTI, ao sangue, aos medicamentos, aos especialistas e aos procedimentos diagnósticos de alta complexidade).
Se os recursos são insuficientes, as grávidas deveriam ser priorizadas para o uso dos recursos oferecidos.
Por estas e outras situações que nós da Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos exigimos do Estado brasileiro e dos governos estaduais e municipais providências políticas, técnicas, viáveis, abrangentes e urgentes que busquem EFETIVAMENTE a redução e o controle da morte materna e suas causas mais diretas, como o aborto inseguro, o preconceito e o descaso.
Exigimos uma Assistência Integral à Saúde da Mulher dentro de princípios e práticas humanizadas, integrais e universais. Dentro do conceito de Direitos Reprodutivos, concebido no âmbito dos Direitos Humanos!
Fonte;Rede Feministas.

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